Por Fabson Gabriel
Em 2014, o jornalista estadunidense Michael Wolff lançou um livro com o título “Televisão é a Nova Televisão”, onde fala sobre como a TV vem conseguindo se adaptar à era digital. Essas transformações tecnológicas e culturais no modo de assistir televisão é tema de uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE de autoria de Gêsa Karla Maia Cavalcanti. O estudo conclui que a TV Social permite que as televisões se posicionem de forma estratégica, pois estimulam o consumo dos programas dentro da grade televisiva e reforçam a lógica da programação de conteúdo de forma ininterrupta. Na dissertação “Televisão e redes sociais: configurações de TV Social em Malhação”, orientada pela professora Yvana Fechine, explorou como esse meio de difusão de programas busca criar, através das redes sociais digitais (Facebook, Instagram, Twitter) e aplicativos integrados ao televisor, um sentimento de compartilhamento em torno dos seus conteúdos, o que permite os espectadores comentarem e conversarem, conectados em rede, sobre os conteúdos que consomem. O termo TV Social é utilizado na pesquisa para designar o fenômeno que confere à televisão o poder de estimular os espectadores a comentar sobre o que veem enquanto estão assistindo, seja entre si, ou com os produtores da programação por plataformas on-line. E, como fruto de análise acadêmica, a pesquisadora evidencia que “essa definição permite que as transformações no modo de assistir televisão sejam tratadas como algo de contornos próprios, apresentando fatores inseparáveis e evitando que se percam entre os existentes no cenário da cultura participativa”. Gêsa também observa que conseguiu identificar como tem funcionado a TV Social no contexto da telenovela brasileira. “Buscamos verificar em que formato televisivo as estratégias de TV Social possuem maior aderência e identificamos a ficção seriada e, dentro desse formato, o gênero telenovela. Com essas direções, partimos para observação das produções das emissoras que mais investem na construção de produtos convergentes e chegamos à Rede Globo", explica. MALHAÇÃO | Com esse propósito, a autora escolheu o programa Malhação como objeto de estudo por ser o mais duradouro e principal produto de ficção seriada voltada para o público jovem na emissora; por ter se configurado nos últimos anos como um espaço de teste para estratégias que articulam o conteúdo televisivo com o da internet e por existir um constante nível de engajamento dos fãs de Malhação nas redes sociais. O estudo identifica as potencialidades da TV Social como estratégia engajadora para aumentar a audiência tradicional; para criar ambientes ou experiências de controle da audiência; obter dados sobre a audiência e para reforçar a grade televisiva através da manutenção das transmissões ao vivo. Como metodologia, Gêsa realizou um levantamento bibliográfico e análise de conteúdo para entender o fenômeno estudado. Após essa etapa, estabeleceu a conceituação do termo “TV Social”, a partir da análise de suas recorrências. Com o fenômeno caracterizado, o objetivo foi observar as estratégias da TV Social recorrentes na telenovela Malhação da Rede Globo, adotando uma concepção descritiva e métodos de levantamento via questionário, estudo de caso e análise de atitude. Os dados coletados durante a observação foram apresentados com base na identificação de estratégias recorrentes, são elas: hashtags diárias nas redes sociais, os aplicativos Malhação e Malhação no Ar e chats com o elenco. Um exemplo do poder da TV Social é o modo como, na 22ª temporada do programa analisado, o casal formado pelos personagens Pedro e Karina ganhou destaque através das redes sociais e acabou se tornando o casal principal da trama, ocupando o lugar de Duca e Bianca. Essa prospecção refletiu ainda na ação de inserção de marcas, feita com Coca-Cola para a campanha “Com quem você quer beber uma Coca-Cola, ele chega à casa da namorada com duas latinhas de Coca-Cola?”, explicando que a ideia é escolher com quem compartilhar a bebida e que ele escolheu uma latinha com o nome dela. “Cada vez mais as emissoras estão conectadas, estão desenvolvendo conteúdos pensando além da primeira tela e encontraram formas de se tornarem cada vez mais presentes através das redes sociais. Na verdade, na maior parte do tempo, é o conteúdo da TV que pauta a produção de conteúdo e as conversações em rede”, destaca. Na pesquisa prévia realizada como forma de sondagem do campo, Gêsa conversou com mais de 400 telespectadores de Malhação e 63% dessa amostra afirmaram usar o Twitter para comentar a novela. “Isso pode ser confirmado quando observamos que Malhação, quase diariamente, está presente nos trending topics (assuntos mais comentados) da rede, isso se deve à própria configuração em fluxo do Twitter, que combina perfeitamente com a noção de TV Social”, explica a pesquisadora.
ENTREVISTA | Gêsa Cavalcanti - mestra em Comunicação
"É o conteúdo da TV que pauta a produção de conteúdo e as conversações em rede"
Ascom | O fenômeno da TV Social tende a se estender para outros programas e outros formatos? Gêsa Cavalcanti | Percebemos que as estratégias de TV Social são mais facilmente integradas na categoria entretenimento – na Rede Globo, por exemplo, que tem trabalhado muito com estratégias de TV Social, todas as novelas possuem as estratégias básicas (hashtags próprias, live-tweeting com emissora, chat com elenco) – com produtos como telenovela, reality shows, talk shows etc. Mas a TV Social também vem sendo muito utilizada, principalmente pelos norte-americanos, para os esportes. Observamos, na pesquisa, o potencial do fenômeno para o jornalismo e até mesmo para a publicidade, com o desenvolvimento de anúncios que são alimentados pelos comentários dos telespectadores.
Quais as plataformas de interação mais utilizadas entre os telespectadores de telenovelas? O Facebook e Instagram são redes bastante utilizadas pelos telespectadores. O que muda são as formas de uso, já que as redes possuem configurações diferentes, tanto do ponto de vista técnico quanto do ponto de vista das apropriações feitas pelos usuários.
Então é possível inferir um posicionamento das redes de televisão do Brasil frente a novas formas de assistir televisão? No Brasil, assim como aconteceu em outros países, as emissoras mostraram um receio inicial. A Rede Globo, por exemplo, tentou impedir seus conteúdos de circularem on-line, tentou impedir que as pessoas falassem sobre seus produtos, mas, em um determinado momento, percebeu a necessidade estabelecer alianças com a internet.
E como está a situação atualmente? As emissoras estão abertas para o assistir conectado, mas isso não representa uma mudança muito grande para o modo como elas se relacionam com o assistir on-demand (ter a disponibilidade de assistir aos programas da preferencia do telespectador). A Globo, mesmo, possui o Globo Play, mas a maioria dos conteúdos só é disponibilizada na plataforma à medida em que vão sendo exibidos na TV, mesmo que só possam ser assistidos na íntegra por assinantes. As emissoras incrementaram o assistir tradicional com ajuda da internet a partir em algo que é a base da televisão, a experiência compartilhada, algo que não está presente no assistir por demanda. |
Mais informações Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE (81) 2126.8960
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Gêsa Karla Maia Cavalcanti
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