PE busca bebês com suspeita de microcefalia sem diagnóstico

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07/02/2016

Falta de recurso, rotina com 3 consultas semanais e crença de que filho é saudável fazem com que mães não busquem atendimento

Equipes sanitárias de Pernambuco estão à procura de bebês com suspeita de microcefalia que nunca chegaram a hospitais de referência, onde deveriam confirmar o diagnóstico e iniciar o tratamento. Em boa parte, são mulheres de baixa escolaridade, pouca renda e moradoras de regiões menos desenvolvidas, que saem da maternidade para casa e não fazem mais nenhuma consulta médica. O governo estadual admite fazer busca ativa para encontrar essas mães, mas diz não existir uma estimativa oficial de quantas são.

O balanço mais recente aponta que há 1.159 casos sob investigação de bebês nascidos com perímetro cefálico menor do que o considerado normal em Pernambuco. O dado inclui tanto crianças que nunca receberam auxílio médico quanto as que foram encaminhadas para unidades de saúde e aguardam resultados de exames para confirmar a microcefalia. Para especialistas que atuam na força-tarefa do Estado, entretanto, ao menos metade desses recém-nascidos não passou por procedimento médico depois que saiu da maternidade.

O número de casos confirmados em Pernambuco saltou de nove, em média, por ano, para 153 em seis meses. No início, as suspeitas eram encaminhadas para o Hospital Universitário Oswaldo Cruz, no Recife, que acompanha ao menos 300 bebês. Também há atendimento em Caruaru e Garanhuns, no agreste, Serra Talhada e Petrolina, no sertão, e em outras duas unidades na capital.

Suspeita. Moradora do interior, a jovem Valquíria Cristiane dos Santos abandonou os estudos na 6.ª série, casou-se aos 12 e não aparenta ter mais do que os seus 18 anos, mesmo depois de três gestações. Vive com o marido em uma casa com chão de cimento batido e telhado sem forro, em um bairro pobre e violento de Goiana, cidade com 29 notificações de microcefalia.
Valquíria não trabalha para poder cuidar dos filhos, o mais velho de 3 anos. Já a mais nova, Sophia Vitória, nasceu de parto normal no dia 14 de novembro, com pouco mais de dois quilos e 30 centímetros de perímetro cefálico.

A mãe não sabe, mas Sophia faz parte das estatísticas de casos suspeitos de microcefalia. Desde dezembro, são notificadas todas as crianças com no máximo 32 centímetros de período cefálico – e não mais com até 33, a antiga medida. Para ter a confirmação, é preciso fazer um exame de imagem que permite ao médico detectar más-formações provocadas por algum agente infeccioso, como nos casos associados ao zika vírus, citomegalovírus e toxoplasmose. Se o exame não apontar problema, o caso é descartado.
“Olhei ela dos pés à cabeça, mas não achei nenhuma anormalidade. Só nasceu um pouco magrinha”, conta a jovem. “Eu pedia para Deus mandar ela perfeita para mim. E Ele mandou.”

Valquíria teve febre no sétimo mês de gestação, mas diz não ter sido diagnosticada com nenhuma doença específica. Segundo conta, ficou três dias internada na maternidade e nenhum funcionário a alertou sobre a chance de a filha ter algum tipo de má-formação.

Ela também não foi procurada nem passou por um médico depois disso. Em comparação com os irmãos, Sophia parece ter a cabeça um pouco menor nas laterais, mas para Valquíria a filha está bem. “Ela é mais calma do que os outros. Só chora para tomar banho e mamar.”

Motivos. Segundo especialistas, mães e crianças deixam de receber acompanhamento por vários fatores: falta de recurso para ir ao hospital e se hospedar em outra cidade, de orientação, o intervalo para agendar a primeira consulta e até mesmo por acreditar que o filho é saudável. A rotina médica, com duas ou três consultas por semana, também torna a situação mais difícil para mulheres que precisam trabalhar.

A infectologista pediátrica Angela Rocha, coordenadora do setor no Oswaldo Cruz, conta que já ouviu pacientes dizerem que por pouco não desistiram da consulta. “O que está se notando é que, com algumas crianças do interior, a mãe acha o menino ‘meio normal’, porque ele está ganhando peso, se alimentando bem e não está muito irritado”, diz.

Médicos relatam que chegam a receber pacientes pela primeira vez quatro meses depois do nascimento da criança. E a demora pode comprometer a recuperação do bebê. “Quanto mais rápido ele for encaminhado para tratamento, mais cedo recebe estímulos e melhor são os resultados”, diz o médico Carlos Brito, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro do Comitê Técnico de Arboviroses do Ministério da Saúde.

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