José Luiz Delgado: Avaliando a avaliação

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04/04/2017

Há coisa de dois anos, a Faculdade de Direito do Recife foi alvo de uma “avaliação” do MEC. Consta que haverá outra. Não entendo por que a Faculdade não se reúne para discutir os critérios dessas avaliações. Sendo mãe da Universidade Federal de Pernambuco e, de certa forma, da universidade brasileira, tendo uma história e uma tradição, sujeitar-se a esses criteriozinhos mesquinhos, miúdos, somente de fachada, e não os denunciar, é uma lástima.

São avaliações eminentemente burocráticas, formais, nominalistas. Valorizam a dedicação exclusiva (contra-valor, não valor, num curso profissional, como o de Direito). Interessam-se sumamente pelas titulações e pela produção, ou seja pelas aparências, não pelas realidades. Não indagam, por exemplo, se os ilustres “doutores” de fato dão aulas, ou se vivem viajando, “pesquisando”, e largam as aulas nas mãos de monitores ou estagiários-docentes. Muito menos indagam se essas aulas prestam, se são densas e competentes. Não investigam a assiduidade nem a qualidade real dos docentes – conferível, por exemplo, nas avaliações periódicas que os alunos fazem (e que a Universidade esconde) ou no reconhecimento dos paraninfados e homenageados nas turmas de concluintes. Qualidade real do magistério é algo que o lamentável MEC não se interessa em avaliar nunca. Talvez porque viesse a descobrir que alguns dos super-titulados, que prestigia, são muito mal vistos pelos estudantes.

O relatório cita alguns professores sem titulação, portanto imprestáveis e indignos. Um deles é um dos maiores valores da Faculdade, tanto que vive sendo procurado e consultado pelos alunos fora das salas de aula. Prestei-lhe pequena homenagem no meu livro sobre a Faculdade. Basta este caso para concluir que quem desmerece a educação brasileira é o MEC.

Do mesmo modo, a produção. Papel suporta tudo. Suporta muita mediocridade. É claro que a produção é importante (secundariamente importante) e o ideal seria que todo docente deixasse alguns livros para a posteridade. Muitos dos mais notáveis professores da Faculdade praticamente não escreveram nada ou escreveram pouquíssimo – um Andrade Bezerra, um Rui Antunes, uma Bernadete Pedrosa. Importante não é a quantidade, mas a qualidade.

O próprio relatório evidencia a indigência do MEC. Espantaram-me seus erros de português. De regência, concordância, etc. Um, em especial, me horrorizou. Escreveram os dois ilustres doutores da comissão avaliadora: “o curso existe a mais de 185 anos”. A mais? Não é o verbo haver, não é “há mais”? Poderia ser um erro de digitação. Mas ele se repete várias vezes... Não, o problema é ignorância mesmo, é despreparo. Os ilustres relatores podem ser doutores ou pós-doutores. Com semelhante ignorância em português elementar, digo que são analfabetos e deveriam voltar ao vestibular. Se esse é o nível do MEC, o MEC não tem condições de cuidar da educação brasileira. A avaliação do MEC vale tanto quanto o português dos seus avaliadores.

 

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