Alagoas conta com mais de 500 sítios arqueológicos espalhados de norte a sul

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04/03/2018

 

Alagoas é conhecida por suas belas paisagens e praias paradisíacas, além da gastronomia local, dos folguedos e dos belos artesanatos. Todos essas maravilhas encantam moradores e turistas que vêm ao estado à procura de descanso e lazer. Mas, não é só isso que torna o estado um lugar encantador, ele também é muito rico em história.

Muitas das histórias dos nossos antepassados são contadas através de pesquisas e estudos arqueológicos. É um patrimônio que está em todo lugar. A arqueologia é a disciplina científica que estuda as culturas e os modos de vida do passado a partir da análise de vestígios locais e materiais.

Ao estudar determinados lugares e objetos, os arqueólogos revelam valorosas características de determinados grupos humanos. Em Alagoas, as pequisas já apontaram importantes dados para a compreensão dos povos que ocuparam o território do estado ao longo do tempo.

Em Alagoas existem mais de 500 sítios arqueológicos espalhados de norte a sul do estado. Divididos em sítios pré-coloniais (antes da chegada de povos europeus ao território alagoano) e coloniais (sítio datado do ano de 1.500 em diante). Todos eles têm sua própria importância e não existe um sítio que tenha um maior significado, historicamente falando.

Uma particularidade é o Fortim Bass, ocupado por holandeses no século XVII, descoberto recentemente na região de Porto Calvo, e que está sendo escavado e estudado por arqueólogos. Ele é o forte interno mais completo e único do país.

Em alguns contextos, as áreas arqueológicas têm uma densidade maior de sítios e por conta dessa densidade e quantidade, é possível entender melhor determinados períodos de ocupação, questões como o cotidiano e hábitos alimentares de alguns grupos. "É a partir do macro que se consegue entender o todo".

Os sítios arqueológicos são importantes, pois ajudam a recontar e a compreender um pouco da história de nossos antepassados. No caso específico de sítios pré-históricos é possível compreender um pouco da ocupação indígena antes da chegada dos europeus a Alagoas, por exemplo, a forma como eles viviam, como se adaptaram às quetões ambientais, como eram distribuídas as aldeias, quais os lugares eram considerados mais seguros e como se dava a forma de subsistência.

Segundo a arqueóloga do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Alagoas (Iphan-AL), Rute Barbosa, no Sertão do estado existe uma quantidade grande de sítios de pintura que servem de base pra entender o universo simbólico de grupos que são muitos pré-históricos, antes mesmo dos indígenas tupi-guaranis, e caetés, esse grupos já ocupavam o território alagoano.
"Além disso, temos datações em Alagoas recuadas de 3.400 anos, em Delmiro Gouveia, que é um terraço fluvial perto do Rio São Francisco, que se chama sítio São José. Lá, foram feitas algumas datações na época da implantação da barragem de Xingó, onde foram realizados estudos arqueológicos prévios. Essa datação pode até ser mais antiga", explicou.

A arqueóloga Audemilia Carneiro, destaca ainda a importância de Alagoas e das pesquisas para a história do Nordeste brasileiro. "As pequisas nos ajudam a montar toda história do Nordeste brasileiro e também das questões de rotas migratórias e de como esses povos migravam aqui para Alagoas. As pesquisas vão formando todo o contexto histórico da Região Nordeste e também das Américas. Então, quanto mais pesquisas, mais se vai tendo um conhecimento amplo dessa questão da ocupação territorial".

Descobrindo o Fortim Bass - A ocupação holandesa em Alagoas

O Fortim Bass, fica localizado na Ilha do Guedes, em Porto Calvo, município situado a 96 km ao Norte de Maceió. Sua descoberta se deu em 2015, após uma pesquisa arqueológica encomendada pelo Iphan-AL, realizada em parceria com a Arquelog Pesquisas, para estudar o Rio Manguaba.

No projeto inicial, o interesse era em georeferenciar, com coordenadas de GPS, os pontos que tiveram importância histórica para o entendimento do período holandês em Alagoas. Na ocasião, foram localizados portos, engenhos, povoações, etc. desde Porto de Pedras, desembocadura do Rio Manguaba, até Porto Calvo. Os desenhos cartográficos holandeses da época coincidem com o que se tem hoje em dia.

"Foi realizada uma pesquisa que mapeou todos os locais na região do Rio Manguaba que foram ocupadas por holandeses. Foi feito um levantamento com uma cartografia do século XVII e se fez uma sobreposição com a cartografia atual, e nela identificaram inúmeros focos de ocupação, desde engenhos, a própria fortificação, campos de batalha, portos, isso de Porto de Pedra até Porto Calvo", conta a arqueóloga Rute Barbosa.

O fortim faz parte de um conjunto de sítios arqueológicos no Norte de Alagoas que reflete toda a ocupação holandesa, como a disputa do território por questões econômicas no século XVII. Ele fica em uma área fluvial e funcionou como ponto estratégico para os holandeses durante a guerra. Se tratava de um forte de barro, porque não existiam muitos fortes de pedra, e até do ponto de vista militar era mais viável, pois a bala não ricocheteava, ela penetrava no barro.

As pesquisas arqueológicas revelaram um forte construído em terra e que se encontrava soterrado. A edificação se manteve completa até sua descoberta devido a vários fatores, entre eles a erosão que destruiu parte de seus parapeitos e contribuiu para aterrar o fosso. Desta forma, ele se manteve intacto, explica o pesquisador Marcos Albuquerque, coordenador do laboratório de Arqueologia da UFPE e o responsável pela pesquisa.

Segundo ele, após as escavações, foram encontrados um fosso duplo, uma escarpa e uma contraescarpa (lados interno e externo de uma vala ou fosso usado em fortificações), o parapeito e a praça de armas.
"Este era uma forte com quatro meios baluartes, todos com um flanco do sentido anti-horário. O flanco tinha a função de defender o forte de um possível ataque no qual os inimigos estariam dentro do fosso", explica.

À época da ocupação holandesa na região, as tropas de ataque ao cerco de Porto Calvo necessitavam de um apoio logístico. Mantimentos e munição, a chamada "munição de boca" e alimentos eram armazenados na Ilha do Guedes e, a partir daí, acontecia a distribuição para a tropa. O forte, conforme conta o arqueólogo, defendia a ilha de um possível inimigo luso-brasileiro.

Marcos Albuquerque afima que a importância da fortificação vai além da história de Alagoas, ela também reflete na história do Brasil e da Holanda. "A descoberta deste forte não trará importância somente para a região na atualidade, mas também para o futuro. O valor histórico desta descoberta tem grande significância para o entendimento do período da guerra holandesa em Alagoas, no Brasil e na Holanda. Este é o único forte de terra intacto de que se tem conhecimento no Brasil no período holandês", revela o arqueólogo.

Muitas desconhecem o termo fortim, que é uma estrutura de defesa de menor dimensão, ou seja, um pequeno forte. Sendo que um forte, por sua vez, geralmente possui demanda estruturais internas, como alojamento, rancho, paiol etc.

Todo estudo feito nos sítios arqueológicos estão disponíveis ao público. Quem quiser ter acesso ao material é só ir até o Iphan-AL, R. Sá e Albuquerque, 157 - Jaraguá, e solicitar uma cópia dos documentos.

Educação Patrimonial e o fomento do turismo local
Uma das propostas feitas pelo Iphan-AL é a promoção do que eles chamam de educação patrimonial, que se dá através de ações com a comunidade local no intuito de fazer a população se apropriar do processo de preservação e valorização do patrimônio encontrado na Ilha do Guedes.

Segundo o superintendente do Iphan-AL, Mário Aloísio, o trabalho de pesquisa será de grande importância, tanto economicamente quanto para o fomento do turismo local. "É uma história muito rica que estava adormecida e que, a partir desse trabalho arqueológico, nós estamos retomando e vai ser muito importante pra nós, inclusive, economicamente, porque gera curiosidade, fora a tentativa de criar um parque de visitação arqueológica e um museu de história e arqueologia e para o turismo também".

Para Mário Aloísio, o forte transcende a questão só de Alagoas, pois ele possui uma série de informações que permitem saber mais sobre a ocupação holandesa no território alagoano.

A pesquisa arqueológica e de restauração estão sob responsabilidade do Iphan-AL, bem como a requalificação arquitetônica do monumento. De acordo com o superintendente, a fase de restauração está sendo concluída. Um estudo térmico da terra está sendo feito diariamente com a ajuda de um drone, que marca o território, faz o corte do terreno, mostrando a estratificação, a terra que existia e a reposta.

"É uma tecnologia bastante avançada, sendo usada na restauração que permite uma qualidade de análise futuramente muito grande", ressalta o Mário Aloísio.

Para o turismo, o que tem se pensado é a construção do um Parque Histórico para visitação arqueológica, além do Museu Arqueológico no Reduto Ilha do Guedes. "Acredito que será desenvolvido na região um turismo histórico, como existe em vários países, trazendo emprego, renda, e cultura para a população local", conta Marcos Albuquerque.

Além de toda história descoberta através das pesquisas e construção do parque e museu, o superintendente acrescenta outras formas de explorar o turismo local. "As pessoas que foram à cidade de Porto Calvo também podem aproveitar para conhecer o circuito de engenho, onde poderão ver de perto a produção da rapadura e da cachaça, que são as riquezas da região. Alagoas só tem a ganhar com isso", destaca Mário Aloísio.

 

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