Bienal do Livro da Bahia: 'Esquecer é negar a história', diz Daniela Arbex em bate-papo sobre memória

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11/11/2022

"Esquecer é negar a história e, se a gente esquece, a gente repete os erros do passado". Essa foi a afirmação feita pela jornalista e escritora Daniela Arbex, durante bate-papo na mesa "Brasil e seu difícil livro de histórias", nesta sexta-feira (11), na Bienal do Livro Bahia, em Salvador.

"A gente precisa reconhecer os erros do passado. O Brasil não é um país sem memória, é um país que não escreveu sua memória", complementou.

Quem também participou do debate foi a jornalista, professora e pesquisadora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Fabiana Moraes. A conversa foi mediada pelo jornalista e produtor de conteúdo Rafael Santana. O evento começou na quinta-feira (10), no Centro de Convenções Salvador, no bairro da Boca do Rio, e seguirá até a próxima terça (15).

Para Daniela, estar em um evento literário é um momento de renovação e esperança, onde é possível dialogar sobre a sociedade. Ela também destacou que a importância do jornalismo para apuração dos fatos e combate às fake news.

"Tem uma coisa muito importante nesse projeto de poder, que visa tirar a credibilidade do jornalismo, que eu chamo de era da pós-verdade, onde fulano disse isso, e fulano nega aquilo. O jornalismo faz com que a gente se aproxime mais dos fatos", afirmou.
Fabiana Moraes, por sua vez, falou sobre a subjetividade no jornalismo e os principais critérios da profissão, a isenção e a neutralidade.

"Quando a gente se pergunta sobre isenção e neutralidade, eu me questiono sobre o que a gente tem que ser isento e neutro", disse em relação às tragédias noticiadas e a falta de acessibilidade da população a determinados serviços, como mobilidade por meio do transporte público, saneamento básico, entre outros.

A professora e pesquisadora também destacou que viver é político, bem como os desafios enfrentados pela sociedade no dia a dia.

"A gente perde tempo lendo sobre os bastidores da política, mas a questão, por exemplo, do acesso ao lazer e educação parece que são coisas do Terceiro Setor. Quando falo de isenção e neutralidade é quando o jornalismo deixa de cumprir seu papel primordial que é dar conta da vida das pessoas também. Política é aquilo que uma população inteira enfrenta", enfatizou.

Relação com as fontes e humanização de personagens
Em seus livros, Daniela Arbex debate temas como apagamento social e populações que foram invisibilizadas pela mídia. Conforme a jornalista, ao escrever as obras, ela busca dar detalhes sobre a vida das vítimas a fim de humanizá-las.

"Uma coisa é você dizer que 242 jovens morreram em uma boate, no Rio Grande do Sul", disse ao lembrar da tragédia que ocorreu na boate Kiss em 2013.

"Outra coisa é você dar nome a esses jovens, dizer o que eles faziam, qual a idade deles, o que eles gostavam. Quando você mergulha nesse Brasil profundo e consegue enxergar esses olhos, esses nomes, você sai dessa leitura com um olhar mais consciente", complementou.

Sobre a relação que mantém com as fontes de suas entrevistas, seja para reportagens ou obras literárias, a jornalista afirmou que há uma diferença no diálogo entre "as fontes de poder", como juízes, políticos, entre outros, e "as fontes que são vítimas" de algum acontecimento.

"Minha relação com as fontes de poder sempre foi absolutamente profissional, mas é diferente da fonte que é vítima, no caso, vítima de uma tragédia coletiva, por exemplo. A fonte vai entregar a informação para você através de uma relação de confiança", explicou.

"Essas pessoas, nessa relação [de confiança], vão te entregar o que mais têm de precioso e isso o jornalismo me fez perceber através da literatura: a memória afetiva. Quando a pessoa entrega isso a você, você tem que tratar com zelo", pontuou.
Fabiana também disse que tem uma questão de delicadeza e comportamento ético com fontes que estão em um lugar de vulnerabilidade.

"Muitas vezes quando você estabelece uma relação com suas fontes, ela não te enxerga como [um] jornalista de [tal veiculo], ela olha você como uma chance de ter uma cidadania, de ser ser reconhecida como cidadã. É algo de uma delicadeza enorme. Cria-se uma expectativa em relação a você. Essa relação é, também uma relação técnica, por mais que seja uma relação de humanidade, você está ali porque quer informação, para relatar a vida da pessoa", detalhou.

 

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