Dia Internacional contra a Discriminação Racial é momento de reflexão e luta

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21/03/23

Brasília (DF) – Combate ao preconceito. Garantia de direitos. Busca pela equidade! Esses temas têm sido destaque no mundo inteiro tornando o combate à discriminação racial mais do que uma bandeira, e sim uma verdadeira luta do dia a dia, sendo a data 21 de março estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Dia Internacional contra a Discriminação Racial. A reflexão contra a discriminação racial destaca ainda a contribuição inquestionável da pluralidade étnico-racial do país para o crescimento e maturidade da sociedade e das organizações.

Na Rede Ebserh, estatal vinculada ao Ministério da Educação (MEC) que administra 41 hospitais universitários federais em todo o país, os quadros de lideranças contam, cada vez mais, com pessoas negras na gestão.

Dulciene Silva é gestora no HC-UFMG/Ebserh há 26 anosÉ o caso de Dulciene Cristina da Silva (foto à direita), chefe do setor de Administração do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG/Ebserh). Metade dos seus 56 anos foram vividos na gestão administrativa do hospital. Diz sentir-se feliz e reconhecida e que não percebe preconceito no trabalho por ser negra. Mas nem sempre foi assim. Quando recém-formada em Engenharia Civil, foi contratada por uma construtora para ser chefe de compras e enfrentou problemas com um subordinado que não reconhecia sua autoridade.

“O órgão público, por sua vez, favorece muito o acesso e a aceitação de todos. Você faz o concurso e ponto final. Não tem como lhe excluírem por ser negra”, disse, reforçando também a importância da lei das cotas, sancionada pela Presidência da República em 2012. “Nunca havia visto tantos estudantes negros e pobres estudando com brancos e ricos na Faculdade de Medicina da UFMG”, comemorou.

Ela destaca que para a pessoa negra garantir seu espaço não é fácil. “Minha trajetória é muito feliz, mas vejo muita gente que sofre no seu dia a dia. Ainda ensino ao meu filho adolescente que ele não pode correr na rua e não gosto que use boné estando desacompanhado, pois seria o primeiro a ser parado pela polícia. Essas são barreiras que ainda temos que enfrentar”, desabafa.

Mário Santos sente-se realizado como anestesiologista na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (CH-UFC/Ebserh)Políticas públicas como a lei das cotas buscam diminuir a exclusão social de pessoas negras, com deficiência e indígenas, e têm ampliado o acesso e a inclusão a serviços públicos. No Complexo Hospitalar da UFC/Ebserh, no Ceará, o médico anestesiologista Mário Santos (foto à esquerda) atua com excelência no centro cirúrgico da Maternidade. Aos 33 anos, foi entre uma cirurgia e outra que nos contou que a realização no trabalho é a melhor parte da sua história, a consagração de anos de estudos que começaram em escolas particulares de alto padrão, onde era bolsista como aluno de olimpíadas de matemática.

“Na minha sala, eu era o único negro. Sofri um pouco de bullying dos colegas”. Ele diz que hoje, entre as pessoas que sabem da sua posição e condição social, sente pouca discriminação, mas acaba percebendo “olhares que indagam” e questionamentos de como chegou onde está, um estranhamento que também é racismo. “Essa data é uma tentativa de rememorar tudo o que muitas vezes para nós é difícil de lembrar. A população acaba tendo empatia com grandes tragédias internacionais, como guerras e nazismo, mas esquece de 400 anos de escravidão, em que ocorreram grandes atrocidades contra os negros”, afirma.

Cartilha explica diversas expressões utilizadas que trazem uma origem marcada por discriminação

Ações afirmativas também fazem parte do escopo da Rede Ebserh no combate ao preconceito. O Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC-UFPE/Ebserh), localizado no Recife, produziu uma cartilha que explica diversas expressões da língua portuguesa utilizadas rotineiramente pela maior parte das pessoas e que trazem uma origem marcada por discriminação. No conteúdo do material (clique na imagem do lado direito ou no link acima), são citadas palavras e expressões como “esclarecer”, “denegrir”, “humor negro” e outras tantas que podem causar impacto negativo e que a maioria da população não se dá conta por desconhecimento. Daí a importância de se discutir um tema tão delicado, ao mesmo tempo tão fundamental para a construção de uma sociedade melhor.

Povos indígenas e religiosidade

Mostrando a importância da diversidade e o papel da Rede Ebserh/MEC no atendimento a povos originários, residentes, preceptores e coordenadores do Programa de Residência do Hospital Universitário da Grande Dourados (HU-UFGD), filiado à Rede Ebserh, realizou o acolhimento de residentes na escola Tekora, localizada em território da aldeia Jaguapiru no município de Dourados (MS), uma vez que a unidade hospitalar conta com um Núcleo de Saúde Indígena e ainda tem uma resolução interna voltada à humanização e inclusão, em que autoriza a pacientes indígenas terem acompanhantes por eles indicados em tempo integral. Daí a importância desse primeiro contato com o público que será atendido por esses residentes, além do campo de prático específico em Saúde Indígena a ser desenvolvido durante a residência.

Maricleia Gomes utiliza os serviços especializadas em saúde indígena do HU-UFGD/EbserhMaricleia Gomes (foto à esquerda) deu à luz um bebê que hoje tem dois meses de vida. Moradora do Boqueirão, aldeia localizada em Dourados, ela é da etnia Kaiowá e utiliza os serviços especializadas em saúde indígena do HU-UFGD/Ebserh, onde teve seu parto e para o qual retornou após um mês, devido a uma cardiopatia de seu filho. Há um mês internada com a criança, ela se diz bem acolhida. “Aqui são todos bons, nunca fui discriminada. Indicaria o hospital. Foi bom voltar para cá, porque foi aqui que meu filho nasceu. Então eles já conhecem o caso dele”, conta.

Neste ano, a reflexão de 21 de março ganha um reforço, com a instituição do Dia Nacional das Tradições de Raízes Africanas e Nações do Candomblé, instituída pela Lei 14.519/2023, sancionada pelo presidente Lula em 5 de janeiro. A data reconhece a importância da identidade cultural e religiosa na formação da nação brasileira. Atualmente, o país conta com cerca de 3 milhões de praticantes do Candomblé, com maior concentração nos estados da Bahia e Pernambuco.

O respeito ao ser humano e às tradições culturais de cada etnia devem ser sempre um dever de todos. Duilciene, lá do começo da reportagem, completa que é necessário seguir buscando o protagonismo, incentivando as políticas de reparação que existem hoje e pressionando por mais. “Cada oportunidade vai nos permitindo avançar e alcançar nosso espaço”, conclui.

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