Vereadores rejeitam título de Cidadã Recifense a professora por ela ser trans: 'Não se preocupam com nossa vulnerabilidade', diz

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13/12/2023

Vereadores do Recife barraram em Plenário a concessão de um título de Cidadã Recifense a uma professora devido ao fato de ela ser uma mulher trans. Dayanna Louise, doutoranda em educação, seria homenageada após um requerimento do vereador Ivan Moraes (PSOL). Eram necessários 24 votos, mas houve apenas 20 aprovações, cinco contrários e 14 abstenções.

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"Eu compreendo que não se trata de um ataque pessoal. Entendo que, quando a Câmara Municipal do Recife nega um título de cidadã para uma pessoa que é travesti, isso representa mais um reforço de um processo de social em que, para essas representações políticas, é inconcebível um corpo, sendo travesti, ter algum mérito social. Não se preocupam com a nossa vulnerabilidade", afirmou Dayana Louise.

O caso ganhou repercussão depois que a vereadora evangélica Michele Collins (PP) subiu na tribuna e disse que o título de cidadã, no feminino, não poderia ser dado a "um homem, do sexo masculino", e afirmou que haveria um "erro técnico" (veja vídeo abaixo).

Vereadora rejeita título de cidadã recifense a professora trans

Dayanna se mudou para o Recife em 2003, para cursar teatro pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Após se formar, ela também concluiu a graduação em história pela Universidade de Pernambuco (UFPE) e, atualmente, faz doutorado em educação na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Também já cursou serviço social.

Ela trabalhou como conselheira na Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco e, como professora, orientou trabalhos no âmbito dos estudos de gênero e sexualidade e dos direitos humanos, tendo quatro trabalhos premiados nacionalmente.

Dayanna também lembra que um dos seus primeiros trabalhos como professora foi em um cursinho comunitário de uma igreja evangélica. "São as coisas da vida, né? Porque agora quem me persegue é uma vereadora fundamentalista", disse.


A fala transfóbica foi levada à Comissão de Ética e Decoro da casa (confira mais abaixo). A vereadora se pronunciou em nota (leia no final desta reportagem).

O Projeto de Decreto Legislativo foi criado pelo vereador Ivan Moraes (PSOL), em reconhecimento pelo trabalho de Dayanna, que é natural de Carpina, na Zona da Mata de Pernambuco, e é professora da rede pública há mais de 10 anos, com atuação em inúmeros projetos para promoção dos direitos de pessoas LGBTQIA+.

Ele apresentou o projeto no dia 11 de setembro, e a votação foi na segunda-feira (11). Eram necessários três quintos do total de 39 vereadores da casa, o que equivale a 24 votos.

Nesse dia, Michele Collins utilizou o plenário para se posicionar contra o projeto antes da votação, e chegou a dizer que Dayanna Louise é um homem trans, e não uma mulher trans, que é o caso.

"O vereador Ivan Moraes está propondo que um homem, porque é do sexo masculino mas se sente mulher. É um homem trans, né? Uma pessoa LGBT. E ele [o vereador] quer que essa pessoa, que é um homem, do sexo masculino, receba o título de cidadã recifense", afirmou a vereadora.

Michele Collins disse que iria se ater ao Regimento Interno da Câmara Municipal, e disse que na Comissão de Legislação e Justiça votou contra o projeto porque o título de cidadã seria para pessoas com sexo biológico feminino, independentemente do gênero, assim como o de cidadão seria para pessoas do sexo biológico masculino.

Michele argumentou que o regimento para títulos de cidadania foi alterado em 2018 para distinguir cidadão e cidadã, pois, de acordo com ela, "há apenas dois sexos: homem e mulher".

"Contrário ao Regimento, que diz que só quem pode receber [o título de cidadã] é o sexo feminino. Como é que nós, vereadores, vamos dar o título de cidadã para um homem? Mesmo que se sinta mulher, aí eu respeito a decisão dele, porque é uma questão de gênero, não é uma questão de sexo, porque sexo só existem dois: masculino e feminino", declarou a vereadora.