Junho de 2013: cinco anos depois, parte das medidas para responder aos protestos não saiu do papel |
13/06/2013 Segunda-feira, 17 de junho de 2013. Mais de 250 mil pessoas saem às ruas em dezenas de cidades de todo o país. Em Brasília, a marquise do Congresso Nacional é tomada por manifestantes, e a cena ilustra a escalada do movimento que nasceu em atos contra o reajuste de tarifas de transporte e revelou uma longa lista de insatisfações dos brasileiros. "De fato, está difícil entender", afirmou, na manhã seguinte, o então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho (PT). "Nós somos acostumados com mobilização com carro de som, com organização, com gente com quem negociar e liderança com quem negociar e poder fazer um tipo de acordo", acrescentou o ministro, à época responsável pela interlocução do governo com os movimentos sociais. Cinco anos depois, parte das medidas anunciadas pelo governo e pelo Congresso segue no papel: "Ampla e profunda" reforma política; Criação do programa Mais Médicos; Redução de passagens no transporte público, combate à corrupção, mais segurança e serviços públicos no "Padrão Fifa" foram alguns dos temas que apareceram no mosaico de reivindicações e que ainda aguardam uma resposta contundente das autoridades. O "padrão Fifa" foi usado em cartazes porque um ano depois o Brasil sediaria a Copa do Mundo de futebol da Fifa. Junho/2013 - Manifestantes ocupam o gramado em frente ao Congresso Nacional, em Brasília, durante protesto por demandas diversas, como mais recursos para saúde, educação, passe livre no transporte público e contra os gastos com a Copa do Mundo (Foto: Arthur Monteiro/Agência Senado) Junho/2013 - Manifestantes ocupam o gramado em frente ao Congresso Nacional, em Brasília, durante protesto por demandas diversas, como mais recursos para saúde, educação, passe livre no transporte público e contra os gastos com a Copa do Mundo (Foto: Arthur Monteiro/Agência Senado) Pactos À época presidente do Congresso, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) declarou: "Para excesso de democracia, mais democracia". Há cinco anos, ambos colocavam em votação uma lista de projetos para tentar contemplar os desejos variados das ruas. O Palácio do Planalto também reagiu. Na oportunidade, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o governo estava "ouvindo essas vozes pela mudança". Para a então presidente, os brasileiros enviavam uma mensagem direta por "mais cidadania, por melhores escolas, melhores hospitais, postos de saúde, pelo direito à participação". "Essa mensagem direta das ruas é de repúdio à corrupção e ao uso indevido do dinheiro público". – Dilma, junho de 2013 Responsabilidade fiscal; Dilma Rousseff propõe cinco pactos nacionais Reeleita em 2014, Dilma sofreu impeachment em 2016 sob a acusação de crimes de responsabilidade fiscal – as chamadas "pedaladas fiscais" no Plano Safra e nos decretos que geraram gastos sem aval do Congresso. Desde 2013, os gastos do governo superam as despesas. Vice de Dilma até o impeachment, o presidente Michel Temer adotou o teto de gastos, mas trabalha com meta fiscal para 2018 com déficit de até R$ 159 bilhões. Resultado das contas públicas Os números da inflação A ideia do plebiscito foi sepultada. Isso porque o Congresso decidiu aprovar alterações na lei eleitoral na chamada "minirreforma". Uma das principais mudanças da época, contudo, foi encabeçada pelo Supremo Tribunal Federal. Dois anos depois, em 2015, declarou inconstitucionais as normas que permitiam as empresas a doar para campanhas eleitorais. Na prática, o STF proibiu doações empresariais. Diante disso, as eleições de 2016 foram realizadas sem doações empresariais, o que se repetirá na disputa deste ano. Para tentar compensar o baque no financiamento das campanhas, o Congresso aprovou em 2017 a criação de um fundo com recursos públicos para financiar as candidaturas. Ainda foi estabelecida a previsão de limites de gastos de campanha, a criação de uma cláusula de desempenho e o fim das coligações proporcionais, a partir das eleições de 2020. Câmara discute as propostas da reforma política A promessa foi cumprida. Em julho de 2013, foi lançado o programa Mais Médicos. Em 2016, o programa foi prorrogado por Temer por mais três anos. Segundo o Ministério da Saúde, atualmente o Mais Médicos tem 18,2 mil vagas em mais de 4 mil municípios e 34 distritos indígenas, o que beneficia mais de 63 milhões de pessoas. Até maio, o programa tinha 16,6 mil médicos, dos quais 8,5 mil cubanos. Números do program Mais Médicos Ano Nº de médicos em atividade Nesses últimos anos, foram criadas 11.859 vagas em cursos de medicina e mais 11.841 vagas em residência médica. Transportes Deputados e senadores aprovaram, e Dilma sancionou, o projeto que eliminou as alíquotas das contribuições sociais para o PIS/Pasep e a Cofins que incidem sobre o transporte coletivo em municípios e regiões metropolitanas. Dilma anunciou, ainda, a destinação de mais de R$ 50 bilhões para investimentos em obras de mobilidade urbana. Cinco anos depois, o Ministério das Cidades informou que foram selecionadas, junto a estados e municípios, 203 empreendimentos, que somavam à época R$ 32 bilhões em investimentos do governo federal. A cifra de R$ 50 bilhões era fechada com recursos de contrapartidas de estados e municípios. As propostas selecionadas seriam destinadas a implantação de metrôs, VLTs, BRTs, corredores de ônibus, trens urbanos dentre outros modos de transporte coletivo urbano de passageiros. "A maior parte dos empreendimentos selecionados não chegou a ser contratada, restando apenas 65 empreendimentos ativos no momento". – Ministério dos Transportes Linha 1 do Metrô de Salvador (BA): investimento de R$ 283 milhões de recursos federais para conclusão da linha 1 do metrô; O governo anunciou a redução de R$ 0,46 no litro do diesel na refinaria, preço sem reajuste por 60 dias. A União vai compensar perdas da Petrobras e bancará um subsídio de R$ 9,58 bilhões até o final do ano para garantir a queda no diesel. Educação Deputados e senadores aprovam a proposta, mas definiram o repasse de parte dos recursos para a saúde. Diante disso, o texto sancionado por Dilma em setembro de 2013 destinou 75% dos royalties do petróleo e 50% do Fundo Social do Pré-Sal para educação. O texto determinou ainda que 25% dos royalties devem ser usados em saúde. Segundo explicação do governo à época, os recursos deveriam alcançar R$ 19,96 bilhões em 2022 e totalizar R$ 112,25 bilhões em dez anos. Milhares de pessoas fazem passeata no Rio de Janeiro As manifestações aconteceram quase um ano antes de a Operação Lava Jato ser deflagrada pela Polícia Federal. A operação já ultrapassou 50 fases e levou à prisão políticos dos mais variados partidos, doleiros e donos de grandes empreiteiras. Em 2013, deputados e senadores buscaram reagir ao grito contra a corrupção por meio da votação de projetos relacionados ao combate à corrupção: PEC 37: A Câmara arquivou a PEC que impedia o Ministério Público de promover investigações criminais; O tema ganhou destaque novamente com o pacote que reuniu medidas de combate à corrupção propostas pelo Ministério Público Federal e avalizadas por mais de 2 milhões de assinaturas de cidadãos. Ao aprovar o pacote, a Câmara o desfigurou, aprovando a previsão de aumentar penas e considerar hediondo crimes como corrupção passiva e corrupção ativa. O pacote ainda não foi analisado pelo Senado. O que dizem os analistas Para esses analistas, os brasileiros não percebem melhoras nos serviços públicos. O avanço da Lava Jato expôs a corrupção entre empresários e políticos, fazendo com que a população viva um momento de descrença na política, às vésperas de eleger um novo presidente da República. Para o sociólogo e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP) Rodrigo Augusto Prando, os pactos propostos por Dilma e as votações no Congresso foram uma tentativa de demonstrar que os políticos não estavam desconectados da sociedade. "A classe política tentou dar algumas respostas. Agora, se tivesse entendido a mensagem, teria levado a sério uma reforma política que nunca foi feita na qualidade e na densidade que precisaria ser feita. As pessoas querem falar mais, querem participar". "Os políticos precisam não ter medo da opinião pública, fazer as reformas que o Estado precisa, a exemplo da reforma da Previdência. Isso provocaria mudanças reais". "A mensagem basicamente era: 'Não queremos mais do mesmo, não queremos uma classe política que procure só os seus próprios interesses, queremos uma classe política democrática, que responda a população'", disse. Na opinião da professora, a resposta aos protestos passaria por uma aliança de grupos políticos para aprovar reformas amplas, porém, Dilma não teve força para liderar esse movimento. Esther identific como legado positivo das manifestações de junho de 2013 uma maior politização da sociedade, em especial dos jovens. O cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer concorda com a análise. Para ele, as jornadas de 2013 também deixaram lições de como organizar grandes movimentos, o que foi utilizado nas manifestações que incentivaram o impeachment de Dilma.
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