Aprendendo com o sexo dos insetos

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11/06/2017

 

O que diferencia os hábitos sexuais dos homem dos de alguns insetos? Talvez muito menos do que se imagina. É o que concluiu o geneticista inglês John Angus Bateman, lá pelos anos de 1948. Um experimento feito por ele com moscas-da-fruta (Drosophila melanogaster) revelou que o comportamento desses insetos, da paquera aos "finalmentes", dialoga com o da maioria dos homens e mulheres.

Maioria. Não todos, é claro. Após várias experiências com moscas de ambos os sexos, o pesquisador percebeu que os interesses reprodutivos delas são distintos: enquanto os machos desejam garantir a paternidade, as fêmeas decidem por si mesmas qual o melhor parceiro para ser o pai dos seus filhos. Para chegar a essa conclusão, Bateman simulou duas situações. Em uma jarra de vidro, colocou um macho para copular com três fêmeas. Cada uma pôs seis ovos, ou seja, tiveram 18 filhotes do mesmo macho. Numa outra, inverteu o cenário (uma fêmea para três machos). Mesmo copulando com todos, ela privilegiou apenas um para compartilhar o seu material genético.

Isso ocorreu, explica o professor do Departamento de Zoologia da UFPE Wendel Pontes porque as fêmeas possuem "recurso limitante". Ou seja, a capacidade de reconhecer em apenas um macho o seu provedor - mesmo se permitindo copular com vários outros. Logo, é ela quem escolhe com quem quer dividir os seus genes antes de pôr os ovos. "Uma fêmea gasta muito tempo e energia durante a gestação. Ela investe no melhor alimento durante esse período e no cuidado pós parto. Então, por conta disso, ela tende a ter critérios. O macho não. Ele faz sexo e vai embora. Ficam para as fêmeas o trabalho de cuidar da prole", diz o professor, referindo-se a insetos - e não a seres humanos.

A dúvida sobre o caráter do macho também paira no mundo desses pequenos animais. As fêmeas querem saber se o pretendente tem cacife suficiente para ser o pai dos seus filhos. Afinal, por mais que ela copule com diversos, não pode ser qualquer um o privilegiado. Os interessados precisam antes convencê-la. E o quesito beleza tem sua importância. Afinal, a primeira impressão é sempre a que fica. Essa exigência não é uma particularidade das moscas. "A maioria das borboletas fêmeas também tende a ser atraída pela simetria do macho. Ela vê isso por meio das cores, brilho e formato das asas. E os indivíduos jovens tendem a ser mais atraentes. É nessa fase que as asas estão intactas, bonitas. À medida em que envelhecem, perdem escamas e a coloração. Os bonitões sempre vencem na disputa", brinca Pontes.

Mas há insetos que se utilizam da força bruta para impressionar as pretendentes. Um exemplo são os lucanos ou vacas-loiras, um tipo de besouro com grandes ferrões. Nessa espécie, as mandíbulas não servem só para capturar presas, mas também para causar deslumbramento .Quanto maior são, mais atraentes se tornam para elas. E mais perigoso fica para os seus concorrentes. Os ferrões funcionam como uma arma na disputa entre eles. O vencedor conquista o coração da fêmea. "Digamos que ela está lá e aparecem vários querendo copular. Os machos então usam a força bruta para empurrarem uns aos outros e resolver o assunto. Nesse caso, tamanho é documento", afirma o pesquisador.

Na pré-história
Embora não seja antropólogo, Wendel Pontes acredita que esse despertar para o outro, principalmente por parte das fêmeas, vem desde os primórdios da história. "Nos grupos primitivos, o macho que caçava de forma mais eficiente e era o mais forte num clã, tendia a ser visivelmente atraente para as mulheres. Naquele tempo, o instinto falava mais alto. Hoje, os tempos são outros, assim como os valores. Mas, um homem que entra numa academia, por exemplo, torna-se mais atraente fisicamente para as mulheres que gostam de homens sarados. Para algumas, a aparência encanta à primeira vista", afirma o pesquisador.

E eu com isso?
Pode parecer balela entender o comportamento sexual de insetos, como eles se reproduzem e o ambiente mais propício para que tenham as suas crias com tranquilidade. Mas acreditem: não é. Para que o grau de extinção de um animal não se agrave ou uma espécie entre na lista de ameaçadas, por exemplo, é preciso conhecer as particularidades de cada um. "E isso não vale apenas para insetos, mas para diversos grupos de animais. É esse conhecimento que nos chamará a atenção para como valorizá-los na natureza. Ao preservar espécies, você não afeta a seleção sexual para algumas nem compromete a população. A comercialização em grande escala do marfim é um exemplo. Compromete na escolha das fêmeas, pois elas e o mercado preferem as presas maiores", justifica.

Outro exemplo comum, destaca Pontes, é o desequilíbrio ecológico causado pelos homens para controlar pragas agrícolas. Em meio às plantações, instalam-se armadilhas adesivas à base de moléculas que simulam o ferormônio sexual das fêmeas. Esse "perfume" atrai os machos que, ao invés de copular, acabam ficando presos nessas armadilhas e morrem em seguida. "Quando se retira uma grande quantidade de machos da natureza, sejam insetos ou não, a população fica comprometida. Sem machos, as fêmeas não põem ovos, logo, não perpetuam a sobrevivência da espécie", conclui o estudioso.

Curiosidades sexuais no mundo dos insetos

A vida é curta, mas vale a pena
Algumas borboletas e mariposas machos morrem logo depois do sexo. Isso ocorre porque eles fazem esforços extremos para assegurarem a qualidade do seu esperma durante o curto período de fecundidade das fêmeas - uma vez ao ano. Esgotam seus músculos e tecidos, gastam toda a sua energia para garantirem a paternidade. Em outros casos, a própria fêmea mata o seu parceiro sexual. A fêmea do louva-a-deus é conhecida por comer a cabeça do companheiro após o ato sexual. Mas, isso só acontece quando elas estão com fome e não tem outra comida por perto.

Idolatria à castidade
Numa tentativa de evitar que a fêmea acasale com outro macho, algumas espécies de borboletas e moscas, a exemplo da mosca-da-fruta, usam uma técnica que enrijece a abertura genital da fêmea, agindo como um cinto de catidade. À medida que o macho ejacula ele solta uma substância que preenche o canal vaginal, vedando-o. Assim, impede que outro macho copule, garantindo a paternidade. Eles gastam bastante energia para produzir a susbtância, o que dá à fêmea a sensação de saciedade sexual. Vale ressaltar que essa estratégia não compromete a sobrevivência dos filhotes. A passagem dos ovos é distinta do canal sexual.

Esperma vitaminado
Entre a maioria dos insetos machos, os grilos se diferenciam por se preocuparem com a mãe dos seus filhos. Após a cópula, ele deixa presa à fêmea uma carnosidade proteica chamada espermatofílax. Durante os dias de gestação, a fêmea se alimenta dessa substância que serve tanto para melhorar a qualidade genética dos ovos quanto preserva a vida dela. Isso porque, ao dispor desse alimento, ela evita andar em busca de presas, correndo o risco de chamar a atenção de predadores, como pássaros. O macho que lança uma boa quantidade de espermatofílax também garantem a saciedade sexual de sua parceira.

Fingindo de morta
Uma recente descoberta sobre o comportamento de uma espécie de libélula, a Aeshna juncea, revela que ela dá um "perdido" no macho quando não está nenhum pouco a fim de sexo. Ela voa sem parar, numa tentativa de fugir. Mas, quando ela percebe que não tem jeito de fazê-lo cansar de tentar, usa de uma tática infalível: cai de repente e finge-se de morta. E por ali fica minutos, parada, até o macho perceber que ela "morreu". Plano executado com sucesso, ela volta a voar tranquilamente. Até ter que fazer tudo de novo...

Beleza ou investimento? A depender do caso, tanto faz!

Lagos que dispõem de uma maior quantidade de vegetação e livre de predadores são mais atraentes para as libélulas procriarem. Mais atraentes até que a beleza dos machos. E são nesses espaços, bem protegidos, que há sempre um "chefão" tomando conta (sim, eles são bem territorialistas!). Mas, para chegar à conclusão de que a beleza pouco importa quando a fêmea vê no ambiente uma boa casa para os seus filhotes, um pesquisador simulou quatro situações ao longo de um rio. Escolheu dois trechos pobres (sem vegetação), soltando um macho atraente (maior e com grandes manchas nas asas) num trecho e, no outro lugar, um macho sem atrativo algum. Claro que, nesse caso, o bonitão ganhou. Mas, quando o estudioso separou dois trechos bem arborizados (um macho mais vistoso num canto e no outro um menos atraente), não teve errada: ambos se tornaram papais.

 

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