Covid-19: estudo mostra como 59 casos da doença foram associados a um voo de 7 horas para a Irlanda

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29.10.2020

Um voo internacional de sete horas e meia para a Irlanda, durante o verão, foi associado a um surto de 59 casos de Covid-19, de acordo com um estudo realizado pelo Departamento de Saúde Pública Irlandês. O artigo foi publicado no jornal científico "Eurosurveillance".

A aeronave tinha apenas 17% de ocupação, com 49 passageiros, além de 12 tripulantes. Desse voo, 13 passageiros, com idade entre 1 e 65 anos, foram contaminados pelo coronavírus. Doze deles apresentaram sintomas. Nove usavam máscara, uma criança não usava, e a informação sobre os outros três é desconhecida.

Os passageiros voaram para a Europa a partir de três continentes diferentes. O artigo não detalha qual foi a companhia aérea ou de onde o voo saiu. O sequenciamento e análise do genoma de amostras referentes a cinco casos sugeriu fortemente uma única fonte de infecção, segundo a publicação.

De acordo com o estudo, não há informação sobre o caso de origem. No entanto, um passageiro relatou que uma pessoa de sua família havia testado positivo para a doença três semanas antes da viagem.

Uma equipe nacional de controle de surtos foi convocada para investigar, identificar e entrevistar os casos, além de supervisionar o rastreamento de contatos e estabelecer medidas de controle.

De acordo com a investigação, esses 13 passageiros transmitiram o vírus para outras 46 pessoas. "Este surto demonstra o potencial de disseminação do Sars-CoV-2 associado às viagens aéreas", afirmam os autores.

"É interessante notar que quatro dos casos de voo não estavam sentados ao lado de qualquer outro caso positivo, não tiveram contato na sala de trânsito, usaram máscaras faciais durante o voo e não seriam considerados contatos próximos sob a orientação atual do Centro Europeu de Prevenção de Doenças e Controle (ECDC)", destacam.

O artigo recomenda que avisos de saúde e responsabilidade pessoal e verificações do estado e da companhia aérea sejam realizados para impedir a viagem de pessoas com sintomas. "Medidas rigorosas de prevenção e controle de infecções a bordo são vitais para reduzir o risco de transmissão sintomática e assintomática durante o voo. Restrição de movimento na chegada e rastreamento de contato robusto são essenciais para limitar a propagação pós-voo", indicam os autores.

'Usar máscara é a medida essencial nos voos'
O virologista Paulo Eduardo Brandão, da Universidade de São Paulo (USP), destaca que as principais formas de transmissão do coronavírus são por gotículas que saem durante a tosse e a fala, por exemplo, e por aerossóis, que ficam suspensos no ar. O uso da máscara serve como forma de prevenção para ambas as possibilidades.

— Não há como garantir que nesse caso os passageiros não tiveram algum relaxamento. Ao tirar a máscara ao ir ao banheiro, ou para comer, por exemplo. O uso de máscaras é a principal medida essencial durante os voos — afirma Brandão, e acrescenta que o espaçamento entre os assentos também é importante.

Sylvia Lemos Hinrichsen, consultora em Biossegurança e Controle de Infecções e Riscos da Sociedade Brasileira de Infectologia, explica que, de modo geral, nas viagens por transportes aéreos a segurança vai depender do controle que os próprios passageiros vão ter durante o voo e principalmente nos aeroportos.

— É preciso seguir os pilares de lavar as mãos, higienizar o ambiente, usar as máscaras e manter distanciamento entre as pessoas, principalmente no lobby no aeroporto — afirma.

A infectologista, que também é professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) acrescenta ser recomendado buscar voos mais curtos.

— É difícil manter os quatro pilares de cuidados em voos mais longos. Será que os passageiros desse voo para a Irlanda ficaram sem circular, usando a máscara o tempo todo e higienizando as mãos? É difícil — avalia.

A infectologista Tania Chaves, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, destaca que o estudo mostrou uma alta faixa de ataque, ou seja, a capacidade de encontrar pessoas infectadas a partir de um caso primário: de 9,8% a 17,8%.

— Uma faixa de ataque de quase 20% não é desprezível. É realmente um vírus altamente transmissível — afirma.

Ela avalia que o artigo serve como um alerta para a segurança do ambiente das aeronaves.

— Apesar de sabermos que o ar é renovado a cada 3 minutos e há uma filtração de ar reconhecidamente de alta segurança, ela não é absoluta. Por isso as viagens intercontinentais, principalmente as de longa duração, devem ser evitadas. Somente para situações essenciais — indica.

Harvard: risco de Covid-19 no avião é 'muito baixo'
Outro estudo, publicado por pesquisadores da Escola de Saúde Pública de Harvard nesta terça-feira, indicou que os riscos de transmissão da Covid-19 durante voos aéreos são muito baixos, inclusive menores do que o de outras atividades de rotina durante a pandemia, desde que sejam usadas máscaras e tomadas medidas de segurança.

De acordo com a agência de notícias Reuters, o relatório foi financiado pelo grupo comercial Airlines for America e um consórcio de fabricantes de aeronaves e operadoras de aeroportos. O estudo destaca que os aviões são equipados com sistemas de ventilação que renovam o ar da cabine em média a cada 2 ou 3 minutos e removem mais de 99% das partículas do tamanho das que causam a Covid-19.

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