Cantadas e desabafos: páginas “Spotted” viram diário anônimo de universitários

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11/10/2017

O que era apenas para ser mais um canal de envio de correios amorosos anônimos pelo Facebook acabou virando um fórum de discussões e desabafos sobre a vida de universitário.
As páginas “Spotted” são um fórum onde a única regra é o anonimato. Praticamente todas as grandes universidades têm a sua versão. A busca pela conquista pelos corações estudantis é o tema principal, mas não o único.

A palavra inglesa em tradução livre significa “marcado”. A inspiração veio da Europa, onde páginas surgidas em 2012 publicavam flagras curiosos nos metrôs.
As cantadas virtuais são as mensagens mais comuns, principalmente entre alunos que se veem nas universidades, mas que não interagem ou não se conhecem pelo nome. Valem fotos e descrições pessoais. Com sorte, algum amigo em comum vai identificar a pessoa que, se tiver interesse, pode procurar a página para fazer contato. É um correio-elegante contemporâneo.

Um exemplo: “Era por volta de meio dia de hoje, pela rua da vila dos diretórios, que do nada uma pessoa fez eu esquecer que estava com uma fome de passar mal. A princesa estava de camiseta curta com estampa de flores, calça justa preta, tênis preto, a mochila estava bem cheia e era colorida, cabelos longos castanhos e caminhava na companhia de uma amiga e um amigo. Deixa eu saber quem é você, preciso te mostrar um poema”, publicou um anônimo na página da PUC-Rio, que tem 41 mil seguidores.

“Na maioria dos casos, as pessoas têm medo de se aproximar, ainda mais num ambiente de estudos”, explica um dos adminstradores da “Spotted PUC-Rio”.
O canal virtual, no entanto, vai além dos flertes. Em alguns casos, o espaço viram fórum de debates que transbordam a proposta inicial da página.

“Na boa, acho que a noção de cidadania dos alunos da PUC está escorrendo pelo ralo! Na quinta-feira, você rapaz legal com uma mochila da jansport militar com um chaveiro do A a Z chamou pelo menos 5 amiguinhos pra furar a fila, enquanto a gente, os palhaços, ficamos até debaixo de sol. Obviamente, fui a única a reclamar”, reclamou uma estudante, também da PUC-Rio, acompanhada por comentários de apoio ao desabafo.

Casos mais sérios também ganham espaço. Na página “spotted”, da Universidade Federal de Goiás (UFG), um estudante se mostrou indignado com um episódio de desrespeito com as faxineiras do local.

"Eu me pergunto a onde o nosso país vai parar, sendo que até mesmo dentro de umas melhores redes ensinos existe preconceito, o que é mais preocupante é falta de humildade, e até mesmo caráter de um ser que consegue, ter atitudes repugnantes como essa”, criticou.

Na “Spotted UFG” (19 mil seguidores) também há críticas sobre o comportamento dos alunos no restaurante universitário - outro tema onipresente nas páginas Spotted: “Terminou de comer no RU, pegue sua bandeja e vaza”, escreveu um acadêmico.

Também na página da UFG, uma estudante desabafou sobre a indiscrição de um “ficante”: “Infelizmente vivemos em uma sociedade machista, enfim fiquei com um carinha ai e falei pra ele fique só entre nós, dois dias depois comentou com um amiguinho dele ,ai quem virou motivo de piadinha ,a mona aqui, e o cara o pegador (sic)”.

Esses tipos de apontamentos críticos fazem parte da página da UFG, segundo comenta uma das quatro administradoras: “Existem outros tipos de spotted [além dos amorosos], porém a universidade nunca se manifestou sobre nossas postagens especificamente”.

Na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), uma das maiores instituições do Nordeste, a página reúne mais de 4 mil seguidores.

Também lá, o fórum se transformou em um espaço livre de classificados.

“Recentemente eu desenvolvi um aplicativo que tem como objetivo contribuir para segurança publica do jovem universitário. [...] Eu gostaria de levar a ideia para UFPE mas precisaria de 8 voluntários para ficarem tomando conta do APP”, publicou um internauta, prontamente atendido pelos universitários.

Na página da UFPE, além dos flertes e críticas sociais, também há espaço para acolhimento. Recentemente, os administradores aderiram a campanha “Setembro Amarelo”. Eles criaram uma grupo no próprio Facebook colocando em prática a proposta de auxiliar universitários que possam estar passando por problemas psicológicos, principalmente a depressão.

“Todos sabemos que é grande entre os jovens de hoje problemas psicológicos como depressão, fobias, síndromes e outros. Problemas muitas vezes causados até pela pressão da rotina desgastante de estudos da universidade. Muitos alunos da UFPE passam por isso e precisamos fazer algo para ajudar”, disse um dos administradores da página.

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