Oficina Guaianases

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Oficina Guaianases de Gravura.

A Oficina Guaianases de Gravura, um dos movimentos artísticos mais significativos e duradouros do estado de Pernambuco, foi criada, em 1974, com a iniciativa do artista plástico João Câmara de abrir o seu atelier de litogravura (gravura feita com matriz de pedra) para artistas amigos.

No início, funcionou no ateliê do pintor paraibano, na Rua Guaianases, no bairro recifense de Campo Grande. Um grupo pequeno de artistas se reunia, aos sábados, no local, para dialogar, aprender e produzir litogravuras.

Com o crescimento do movimento, a Oficina passou a ser aberta para qualquer artista que tivesse interesse em participar, assim, vários artistas passaram a frequentar o espaço. O grande número de associados fez com que a Oficina se organizasse como uma sociedade civil sem fins lucrativos e precisasse de um espaço físico maior.

Em 1979, a Guaianases mudou-se para o Mercado da Ribeira, em Olinda, passando a funcionar não mais só como ateliê, mas também como um local voltado para promover a arte da litogravura, por meio de cursos, exposições, edições de livros, publicações e cartazes. Passando a ser apoiada pela Prefeitura de Olinda, a Oficina adquiriu novas prensas, foram contratados impressores profissionais, como Alberto e Hélio Soares, que passaram a produzir as gravuras em série. Foram criados, uma Galeria para exposições permanentes de obras no local e cursos sobre litogravura, que eram ministrados por João Câmara e Delano, outro grande artista e idealizador da Guaianases.

A Oficina cresceu e tornou-se um movimento artístico com repercussão nacional, deixando de ser apenas um grupo.

A Oficina também teve o papel social muito importante para esses artistas, a Guaianases não era só um local de produção artística, era também um local de trocas de experiências e afetos, de diálogos sobre a vida, a política, o cotidiano e anedotas também. Podemos perceber a afetividade nas palavras dos artistas José Patrício e Maria Carmem:

“(...) Nessa época os artistas tinham muito mais contato, na Oficina Guaianases mesmo. Contato entre si. Porque todos os sábados, religiosamente, a gente se encontrava na Oficina... Uns com mais frequência, outros com menos; alguns iam todos os sábados, outros, nem tanto. Mas era o local onde a gente se encontrava, e a gente sabia que todo mundo iria no sábado, que era o dia, digamos, de encontro desses artistas. E de outras pessoas que se interessavam pelo trabalho da Oficina e que de alguma forma contribuíam, participavam. Eu acho que a Oficina Guaianases foi muito rica nesse aspecto de congregar os artistas em torno de um objetivo comum”. (Depoimento de José Patrício à Clarisse Diniz, 2006, Apud. DINIZ, 2008, p. 62).

“(...) Durante esse tempo, aos sábados, nós juntávamos assim, um grupo grande, ás vezes até dez artistas que estavam na Guaianases etodos ficavam fazendo gravura, (...) aí nós íamos procurar sempre um bar que ninguém fosse né?, para não encontrar imprensa, não entrar nada...! Quando eles iam atrás, a gente corria deles.[risos] Aí tinha um bar aqui que a gente chama de Bar Cemitério, não sei o nome, mas ficava na mesma rua do cemitério... A gente ficava lá, e a maior parte do assunto era anedota. Brincadeira mesmo” (Depoimento de Maria Carmem à Clarisse Diniz, 2006, Apud. DINIZ, 2008, p. 62).

Participaram da Oficina Guaianases Gravura diversos artistas plásticos de vários estados brasileiros, além dos seus idealizadores João Câmara e Delano, destacam-se Gilvan Samico, Guita Chafifker, Gil Vicente, Humberto Carneiro, Thereza Carmen, Luciano Pinheiro, José Carlos Viana, Tereza Costa Rego, Raul Córdula, Romero de Andrade Lima, Maria Carmen, Maurício Arraes, Maurício Silva, Liliane Dardot, Inalda Xavier, Isa Pontual, Jeanine Uchoa, José de Moura, Petrônio Cunha, José de Barros, José Paulo, José Carlos Xavier, Maria Tomaselli, Mário Ricardo, Marisa Lacerda, Marisa Varella, Rinaldo, Teresa Pacomio, Carlos Haarle, Francisco Neves, Nilza Torres, Flávio Gadelha, José Alves de Moura, José Cláudio, José Patrício.

Durante a década de 1970, os temas mais recorrentes das litogravuras eram relativos à ditadura militar, denúncias e contestações políticas, além do erotismo da liberação sexual, muito característica da época. Nos anos de 1980, houve uma diversificação dos temas que se aproximaram mais da pintura.

Em 1980, a Prefeitura da Cidade do Recife publicou o álbum Imagens do Recife, contendo 15 litogravuras da Guaianases, de vários artistas, todas assinadas, timbradas e numeradas, com texto bilíngue, representando a cidade em seus mais variados aspectos como a praia de Boa Viagem, o Recife antigo, seu Porto, suas pontes, o frevo, mocambos, mangues e caranguejos.

Em 1994, diante de dificuldades e crise administrativa o grupo se desfez. Em janeiro de 1995, em assembleia geral, com todos os membros convocados previamente por edital, a Oficina Guaianases foi dissolvida. Seu acervo, contendo matrizes de trabalhos em papel, construído ao longo de 21 anos, com mais de duas mil litogravuras foi doado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e sua gestão passou para o Departamento de Teoria da Arte daquela Universidade, sendo atualmente chamada de Laboratório Oficina Guaianases de Gravura (LOGG).

Sob a guarda da Biblioteca Joaquim Cardozo, do Centro de Artes e Comunicação da UFPE, o acervo foi recuperado e digitalizado, através do projeto“Arte e Tecnologia: cuidando da memória”, financiado pela Petrobrás e concluído em 2008. Acompanhava a doação um arquivo com toda documentação burocrática produzida pela Oficina entre 1979 e 1995. Esta documentação, gerada durante 15 anos e transferida para a Biblioteca Joaquim Cardozo, agregou mais informações à referida Coleção. São aproximadamente 2.202 documentos, distribuídos em 727 títulos. Esses documentos são frágeis, boa parte se encontra impressa em papel jornal, o que compromete a conservação e inviabiliza a consulta ao documento original.

Os resultados do Projeto apresentam a digitalização das 2.202 imagens distribuídas em 27 tipologias documentais. Cerca de 80% do acervo se encontra disponibilizada em banco de dados referencial e 20% em banco de dados com suas respectivas imagens, facilmente acessíveis no site www.ufpe.br/guaianases.

Mesmo depois do fim da Oficina, as gravuras dela geradas continuam a inquietar estudantes, pesquisadores e artistas. As obras da Guaianases não cessam de correr o mundo, de se deslocarem, de criarem novas redes, de receber novos olhares. Em junho de 2008, o Consulado Geral do Brasil em Nova York, com produção da Universidade Federal de Pernambuco e o patrocínio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, sediou a exposição Oficina Guaianases e Laboratório OGG da UFPE: Tradição e Experimentação, apresentando litogravuras produzidas no período 1975-1994, além de trabalhos de professores do Laboratório Oficina Guaianases de Gravura (LOGG) da UFPE.

Já em fevereiro de 2009, foi a vezda Galeria Capibaribe, no Centro de Artes e Comunicação da UFPE, realizar a exposição Oficina Guaianases de Gravura - Anos 70, divulgando peças do acervo doado à UFPE, que vai do popular ao erudito de inspiração popular, além de produções abstratas de arte moderna e contemporânea. Grande parte da coleção é de arte figurativa, com predominância de figuras femininas.

Recentemente, 2014, o Museu da Abolição-MAB em parceria com o Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística da Universidade Federal de Pernambuco realizou a Exposição “Oficina Guaianases de Gravuras: o olhar Feminino”, sob a curadoria do artista plástico Rinaldo Silva. Para esta exposição, Rinaldo escolheu obras das artistas Guita Cherifker, Inalda Xavier, Isa Pontual, Jeanine Uchoa, Maria Carmem, Marisa Lacerda, Marisa Varella, Teresa Pacomio, Tereza Costa Rego, Ana Lisboa, e Liliana Dardot, dentre várias outras.

Em sintonia com a missão do Museu, a exposição busca comemorar o 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.Oficina Guaianases de Gravuras é um dos movimentos artísticos mais significativos e duradouros do estado de Pernambuco, com repercussão nacional, e tem em seu acervo a importante participação de mulheres artistas, as quais forjaram nas pedras litográficas formas, texturas, sonhos e expressões”.(Exposição Oficina Guaianases de Gravuras: o olhar feminino. Acessado em 02 de fevereiro de 2015. Grifos do próprio texto).

São passados mais de quarenta anos do dia que João Câmara abria seu ateliê para artistas e amigos artistas, e seus frutos até hoje são estudados, pesquisados e são referências visuais para novos artistas. Oficina Guaianases de Gravuras, ontem, hoje e amanhã. (Ver o acervo da Oficina Guaianases)