Código
Civil teve poucas alterações
Professor da Faculdade de Direito
que participou da reformulação do Código
Civil Brasileiro avalia que mudanças não justificam
supressão do antigo código
Silvio Neves Baptista *
O novo Código Civil Brasileiro
entrará em vigor a partir de 10 de janeiro de 2003, mantendo
basicamente a mesma estrutura do Código de 1916. A exemplo
do código vigente, o novo Código Civil está
dividido em duas partes, uma geral e outra especial. A Parte Geral
contém três Livros: I - Pessoas; II - Bens; e III
- Fatos Jurídicos. A Parte Especial traz cinco Livros:
I - Direito das Obrigações; II - Direito de Empresa;
III - Direito das Coisas; IV - Direito de Família; e V
- Direito das Sucessões, além de um Livro Complementar,
regulando as Disposições Finais e Transitórias.
Ao contrário do que tem sido amplamente divulgado, as modificações
introduzidas pelo novo Código Civil foram em número
relativamente reduzido ou, pelo menos, numa proporção
que não justificaria a supressão do Código
vigente. A maior inovação do novo código
foi, sem dúvida, a reunificação do direito
obrigacional, tal como fizera a reforma do código italiano
de 1942, revogando o Código Comercial e consolidando na
lei civil as normas gerais e especiais do direito das obrigações,
inclusive toda a matéria relativa aos contratos civis e
mercantis, aos títulos de crédito e ao direito empresarial
e societário. Com isso, restou ao direito comercial um
campo extremamente limitado.
Na Parte Geral, as principais alterações foram a
cessação da menoridade aos 18 anos; a regulamentação
específica dos direitos da personalidade; a inserção
do estado de perigo e da lesão entre os defeitos do ato
jurídico e a disciplina em separado dos prazos prescricionais
e de decadência.
Na Parte Especial, o Código introduziu o livro do Direito
de Empresa e fez alterações em todas as demais subdivisões
especiais. No Livro do Direito das Obrigações, além
da reunificação do direito obrigacional, o novo
código tipificou seis contratos que não constaram
do código de 1916: o estimatório, a comissão,
a agência e distribuição, a corretagem e o
transporte. Cuidou também das normas gerais da responsabilidade
civil, depois de haver estabelecido as regras especiais da responsabilidade
negocial, deixando no Livro do Direito de Empresa a disciplina
própria da responsabilidade empresarial, sem a menor sistematização.
Quanto ao Direito das Coisas, o novo código retirou a enfiteuse
do rol dos direitos reais, proibindo a sua constituição,
ressalvadas apenas as enfiteuses de terrenos de marinha; introduziu
o direito de superfície e o direito de promitente comprador
de imóvel. Em que pe-se a sua propalada "modernidade",
o novo Código manteve, inexplicavelmente, o anacrônico
instituto da anticrese.
Foi no Direito de Família que se verificou o maior número
de alterações, uma vez que o projeto transformado
em código teve de incorporar ao texto primitivo todas as
inovações introduzidas não só pela
Constituição Federal de 1988, como pelas leis ordinárias
editadas posteriormente a ela. Desse modo, foram inseridas no
novo Código Civil as disciplinas normativas referentes
à extensão do conceito de família aos grupos
formados pela união estável e família monoparental;
à igualdade dos direitos e deveres do marido e da mulher;
e à completa equiparação dos filhos, inclusive
dos adotados.
Afora essas inserções originadas do texto constitucional
e de leis ordinárias que lhe seguiram, o novo Código
Civil fez as seguintes alterações no Livro do Direito
de Família e, entre outras de menor importância,
fixou em 16 anos a idade mínima para o casamento, tanto
para os homens como para as mulheres; trouxe para o texto do código
as regras concernentes ao casamento religioso, antes regido pela
Lei dos Registros Públicos; tratou separadamente os impedimentos
matrimoniais e as causas suspensivas do matrimônio; aboliu
o regime dotal, incluiu o regime de participação
final dos aqüestos, e admitiu a mudança do regime
de bens entre os cônjuges.
Por outro lado, deslocou da parte geral para a especial a matéria
concernente ao bem de família, retrocedendo em relação
aos benefícios sociais concedidos pela Lei nº 8.009/90.
É que enquanto essa lei considera impenhorável o
imóvel residencial próprio do casal, independentemente
de qualquer formalidade, o novo código volta a exigir os
mesmos requisitos para a constituição do bem de
família constantes do Código de 1916, e que haviam
sido derrogados pela citada lei desde 1990. Assim, a partir da
vigência do novo Código, somente serão impenhoráveis
os imóveis residenciais que tenham sido instituídos
como bem de família através de escritura pública
e registrada no Registro de Imóveis, e desde que não
ultrapassem um terço do patrimônio líquido
do instituidor.
Por fim, no tocante ao Direito das Sucessões, as principais
modificações inseridas pelo Código ora sancionado
consistiram na alteração da ordem de vocação
hereditária, concorrendo o cônjuge com o descendente
e o ascendente; na incorporação das regras de sucessão
do convivente da união estável; na inclusão
do cônjuge como herdeiro necessário e na criação
do testamento aeronáutico.
* Sílvio Neves Baptista é mestre em Direito
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