Publicidade
Brasileira: a racionalização do caos
O artigo analisa
como os valores culturais brasileiros são agregados à publicidade,
de modo que esta continue a persuadir por um maior período de
tempo
* Dacier de
Barros e Silva
O impasse comunicativo
criado a partir do desejo do brasileiro de ser consumidor do primeiro
mundo e, ao mesmo tempo, reproduzir a lógica do terceiro mundo,
demonstra-se que é superado pelo paradigma da ·racionalização
do caos· expresso através da forma, por excelência, do homem cordial
brasileiro: o ·humor sensual·, uma das características dominantes
da publicidade brasileira atual. A eficácia deste paradigma se
potencializa ao retornar para a lógica cultural dos espectadores,
ofertando jogos de linguagem que servem para mediar situações
conflituosas na comunicação cotidiana.
Para fundamentar
como se estrutura a lógica de consumo no paradigma publicitário
da ·racionalização do caos·, através da representação do ·humor
e sensualidade·, foram analisadas três publicidades que se mantiveram
efetivas durante anos seguidos. A do ·moço da Bombril·, que representa
os valores típicos do personagem cordial brasileiro, no qual a
eficiência do trabalho é substituída pelo riso maroto ou uma sublimação
da conquista. A do ·não é uma Brastemp, mas· baseia-se no humor
cáustico do terceiro mundismo, fruto do discernimento da qualidade
duvidosa da média de bens produzidos e da construção de necessidades
de consumo e de valores da sociedade brasileira. A ·driblar as
durezas da vida com Dreher· mostra o conformismo da sociedade
brasileira, que ·dribla· as crueldades sociais com Dreher. Estas
peças publicitárias, que receberam ampla aceitação dos consumidores,
do mercado e da crítica publicitária, são concebidas como representações
sociológicas e estéticas exemplares da valorização do anti-herói,
porém dinâmicas enquanto bens simbólicos de consumo na contemporaneidade
brasileira.
O paradigma publicitário
da ·racionalização do caos· pode ser esquematizado da seguinte
forma: o problema é que a sociedade e o mercado brasileiro são
um caos, a marca/produto são agregados aos signos da racionalidade
produtiva, aos valores da sociedade americana, e a solução é o
surgimento da marca brasileira como ·uma bolha de qualidade do
primeiro mundo para você·. Tenta-se mostrar que um produto é melhor
que os outros por suas características ·de primeiro mundo·.
Uma possibilidade
de obter eficácia publicitária é o de adotar o paradigma da ·racionalização
do caos·, ao apresentar pautas comportamentais que emulem valores
do primeiro mundo, que racionalizem o consumidor na obtenção de
vantagens nas representações caóticas da sociedade brasileira.
A utilização ·do homem cordial brasileiro· é uma tentativa de
intensificar o princípio da realidade, sem reprimir o princípio
do prazer. Uma resposta canhestra, porém, mercadologicamente produtiva
é a de racionalizar e potencializar a obtenção de ganhos através
das oportunidades oriundas da situação de abismo social do terceiro
mundo.
O riso e a sensualidade
podem revelar como esconder as cadeias que prendem, limitam e
oprimem. Depende da ótica pela qual eles são expressos e enfocados.
Sendo levado a analisar no futuro a pergunta: Quais ganhos são
possíveis ao rir e sexualizar a ordem e o caos?
* Dacier Barros e
Silva é doutor em Sociologia e professor de comunicação
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