Ano VIII - Nº 109 - Fevereiro/2003












 

Design do móvel contemporâneo no Brasil tem a cara e o jeito do País

Estudo revela que o desenho dos móveis brasileiros, nas décadas de 70 a 90, traz à memória a herança cultural e os valores mais originais da nossa gente

Anderson Lima

Móveis em madeira, plástico ou tecido, artesanais ou industriais. Estas são algumas técnicas e materiais que fazem a cara do mobiliário feito no Brasil. A conclusão está na tese de doutorado O Design do Móvel Contemporâneo Brasileiro: da Diversidade à Especificidade, da designer Virgínia Pereira Cavalcanti, professora e coordenadora do curso de Desenho Industrial: Projeto do Produto da Universidade.

De acordo com o estudo, o diferencial do design do móvel brasileiro é se basear na diversidade de soluções projetuais. “Essa diversidade tem fundamento em algumas características singulares que diferenciam esse design de outros designes do mundo”, explica a pesquisadora. Mais ainda. Esse design traz uma memória, tanto urbana quanto tradicional e popular, que acumula as técnicas produtivas, as heranças culturais e os valores mais originais do povo brasileiro.

Os estilos e as tendências do período contemporâneo, decorrentes principalmente do moderno, mesclam-se e dão origem a dois grandes grupos baseados na estética da forma e dos meios produtivos contemporâneos, com sete categorias ao todo, que falam desde os limites entre a arte e o design até o resgate dos valores culturais populares.

Outro fruto do período contemporâneo, como explica a pesquisadora, é a popularização do design brasileiro. “O design brasileiro já está sendo visto com outros olhos no exterior, mas ainda falta muito porque existe um descompasso tecnológico em relação a outros países”, explica Virgínia Cavalcanti.

O trabalho mostra uma visão panorâmica do design do móvel brasileiro entre as décadas de 70 a 90, com especial atenção para o eixo Rio de Janeiro-São Paulo. “Este é um período de institucionalização do design no Brasil, quando os profissionais começam a ser formados por escolas de Desenho Industrial. Então começa a ser formar um diferencial”, explica a professora. Também são apresentados os principais designers do País, reconhecidos pela crítica nacional e internacional, e uma categorização das principais soluções projetuais encontradas no período.

A pesquisa foi feita a partir da entrevista e da coleta de material iconográfico de aproximadamente 40 designers e empresas especializadas. Foi dada prioridade aos profissionais que tivessem um tempo mínimo de permanência no mercado e com trabalhos que atravessaram o tempo sem perder a qualidade.

O interesse da designer, no entanto, é anterior ao trabalho: “Tinha uma vivência com essa área porque meu pai teve uma empresa de móveis durante 30 anos. Cresci dentro da indústria, conhecendo as técnicas, as formas, os moldes. Então tudo isso pra mim era muito familiar”, revela.

O trabalho foi defendido na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), tendo recebido o Prêmio Design Museu da Casa Brasileira no final de 2002, e pode ser encontrado nas livrarias em breve. “Já entrei em contato com algumas editoras que têm tradição em publicar trabalhos nessa área e elas já demonstraram interesse”, explica Virgínia Cavalcanti.

PERNAMBUCO - Quanto a Pernambuco, a professora explica que não existe ainda um design contemporâneo que represente a cara do Estado. “Se você for às lojas de design do Estado, pode encontrar design desenvolvido em São Paulo, Rio de Janeiro ou mesmo design italiano, mas muito pouco design pernambucano”, explica ela.

Mas a designer, que desenvolve projetos de mobiliário com o jeito pernambucano, dá a dica: “Pernambuco tem um repertório de idéias riquíssimo. Tem manifestações populares únicas, um litoral belíssimo e até a questão do sotaque e do comportamento que, integrados à estética contemporânea, podem ser traduzidos numa leitura do mobiliário. Talvez este seja o caminho para se ter um mobiliário com uma cara mais pernambucana”.