"Os EUA precisam
rever isolacionismo"
O cientista político e
professor da UFPE Jorge Zaverucha faz uma séria advertência,
ao dizer que o terrorismo suicida veio para ficar
José Carlos Targino
Tem surgido na imprensa brasileira
a idéia de que é inevitável, após
os ataques terroristas a Nova York, o estabelecimento de uma nova
ordem mundial. Na sua opinião, que ordem seria essa?
Os recentes ataques terroristas não alterarão em
grande escala o balanço de poder mundial. Os EUA continuaram
a ser o país hegemônico tanto militarmente quanto
economicamente. Contudo, o presidente George W. Bush deverá
aposentar suas pretensões isolacionistas, ou seja, as de
criar um Muro de Berlim às avessas. Aprendeu que necessitou
de apoio mundial para formar uma coalizão anti-Bin Laden.
Deverá ser mais cooperativo com outros países até
mesmo por gratidão. Vide o caso do Paquistão. Acertou
um empréstimo do FMI e suspendeu as sanções
motivadas tanto pelo golpe de estado militar quanto pela autonomia
paquistanesa na elaboração de seu programa nuclear.
Os terroristas pareciam estar
atrás de um lucro simbólico, pois o ataque aconteceu
na cidade-símbolo do capitalismo e contra edifícios
que fazem parte do imaginário mundial. A quem eles pretendiam
mostrar esse "show"?
Os fundamentalistas islâmicos sonham com um "grande
Afeganistão" do Iraque ao Mar Vermelho. Quem obstacula
esta pretensão são os EUA e Israel. Daí Bin
Laden afirmar estar "contra a campanha da cruzada de judeus
e cristãos, liderada pelo maior cruzado (George W. Bush)
sob a bandeira da cruz". A luta política, sob o manto
da religião, é também contra os mulçumanos
não fundamentalistas. Em 1982, o então presidente
sírio, Haffez Assad, que era um muçulmano alawita,
enfrentou os fundamentalistas que queriam apeá-lo do poder.
Arrasou a cidade de Hama, a quarta maior do país, e a transformou
em um grande estacionamento. A Anistia Internacional estima que
morreram, no mínimo, 10 mil pessoas. Egito, Argélia
e Tunísia também se depararam com ameaças
dos fundamentalistas. Esta foi uma das razões pela qual
eles fugiram para o Afeganistão e o Vale do Beeka no Líbano,
lugares onde o Estado é praticamente inexistente.
Os americanos (principalmente
a população novaiorquina) estão apavorados
com a possibilidade de novos ataques. Na sua opinião, os
Estados Unidos ficaram vulneráveis ou não é
possível evitar ataques terroristas?
O grande receio de todos nós é não saber
que tipos de armas não convencionais estão nas mãos
dos terroristas. O medo da população nova-iorquina
é tanto, e isto é uma vitória do terror,
que já levou muitos deles a comprarem máscaras antigás.O
terrorismo suicida veio para ficar. Os terroristas atuam, por
ironia da história, através de redes globalizadas.
Por isso mesmo, é mais difícil combatê-los.
Note que não é o governo do Afeganistão que
está sendo primordialmente responsabilizado do ocorrido,
mas um saudita chamado Bin Laden. Alguém sabe o nome do
presidente do Afeganistão?
O historiador Giovanni Arrighi,
professor da Universidade Johns Hopkins, afirma que, se os Estados
Unidos estão perdendo a hegemonia, é porque não
foram cumpridas as promessas de industrialização
e desenvolvimento dentro do modelo que propuseram ao mundo. Isso
é verdade?
Não encontro evidência empírica para a afirmação
dos EUA estarem perdendo a hegemonia. Nenhum dos atacantes apresentou
alguma proposta contra-hegemônica ao modelo capitalista-liberal
americano. Se os americanos forem sábios constatarão
que o tipo de mercado que patrocinam não é bom nem
para eles nem para o resto do mundo. Imaginar que dividir o mercado
global entre os países mais avançados e os aviltados
pode trazer paz entre povos é falso. Fundamentalismo nesta
escala não surge em países democráticos e
com bom nível de qualidade de vida da população.
Os países árabes que os EUA apóiam, contudo,
são regimes (semi) ditatoriais com elevada concentração
de renda.
Teme-se que o ataque possa reforçar ainda mais a repressão
aos protestos contra a ordem capitalista em particular e a globalização
em geral. O que o sr. acha disso?
É preciso diferenciar os ataques terroristas ao WTC das
manifestações antiglobalizantes. Estas são
de cunho ideológico de matriz esquerdista e, pelo menos
até agora, não pugnam pela morte de inocentes. Tanto
é que a última vítima das manifestações
em Gênova foi fulminada por um agente do Estado. Já
Bin Laden é um milionário que em vez de usar sua
prosperidade para beneficiar seus seguidores, prefere financiar
ações de autodestruição.
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